O futuro do presente

Em tempos de revisão do plano diretor de Porto Velho, devemos discutir soluções para problemas pretéritos e abrir espaço para o futuro. Afinal, que cidade queremos?

Porto Velho possui imensos desafios, e deve considerar soluções inovadoras para lidar com eles. Afinal, o mundo avança exponencialmente e, os próximos 10 anos – período de vigência do plano diretor, prometem transformações no modo de nos relacionar com nossa cidade.

“Não aceite doces e carona de estranhos” não podem mais ser conselhos de pais de nossos tempos. Com a ascensão do transporte por aplicativo em todo o mundo, fica difícil recusarmos a oferta de uma bala do motorista, escolhido por uma rápida operação de algoritmos que se baseia em uma nota de 0 a 5 e na proximidade de nossa localização geográfica. Enquanto estamos sentados no banco traseiro de um carro anônimo, fazemos reservas no nosso restaurante preferido e avisamos aos amigos, por WhatsApp, o tempo estimado-quase-que-preciso de nossa chegada ao local, considerando as mais diversas variáveis de trânsito. Toda essa tecnologia cabe no bolso, mas geralmente encontra-se em nossas mãos, sobre nossas mesas, ao lado de nossa cama, no nosso pulso e ouvidos. Temos hoje muito mais tecnologia que levou o homem a lua na década de 60, e ela tem mudado todo o nosso comportamento social.

Em termos urbanos, optamos por nos deslocarmos por veículos de terceiros, já que sabemos pela internet que hoje vai ter promoção de chopp e, por mais que você confie nos seus reflexos alterados e que o Waze avise onde estão as blitz da cidade, a tolerância ao álcool é zero e a polícia sabe quem desviou da rota da blitz porque nos monitora via drones. A conveniência e o baixo preço dos transportes por aplicativos impactou na compra de automóveis, no uso de transporte público e na disputa por vagas de estacionamento.

Os combustíveis fósseis estão em extinção, em todos os sentidos possíveis. Seja pelos impactos ambientais que causam, suas reservas limitadas e pelos elevados preços praticados, o petróleo está virando fumaça (perdoem-me por esta sequência inevitável de trocadilhos). O desenvolvimento tecnológico de motores movidos à fontes alternativas de combustíveis já não é tão novidade assim. Tanto que os países da península Escandinávia decretaram que, a partir de 2025, só carros movidos a hidrogênio ou eletricidade circularão no país. Uma realidade distante. Será? Já temos o primeiro carro elétrico em Porto Velho.

E os carros autônomos, hein? Já são comuns no Vale do Silício. Pesquisas apontam que, no mundo, existe um acidente de trânsito para cada 100.000 km rodados, em média, com carros dirigidos por pessoas. A estimativa é que, para carros autônomos, esse número seja 1/10 milhões de km. Isso mesmo, 100 vezes mais seguro.

Porém, nossas cidades estão preparadas para essas tecnologias? Nossas leis, não. Até hoje a Uber, Lift e tantos outros aplicativos enfrentam dificuldades para lidar com sua regulação. É que o avanço tecnológico não é igualmente acompanhado pelo regramento. O ex prefeito de Maringá, Silvio Barros (2005-2012), nos disse em uma reunião que, certa vez, a prefeitura de lá enfrentou dificuldades legais quando um empresário local quis trazer para o município a alternativa de instalar um estacionamento tipo carrossel, muito usado no Japão e em outros países que falta espaço. Todos eram a favor da ideia, inclusive os técnicos licenciadores, mas esbarraram em entraves jurídicos.

Mas, voltando ao plano diretor, o que precisamos considerar como avanço tecnológico urbanos nos próximos 10 anos? Silvio Barros alertou para locais estratégicos na cidade para para recarga de carros elétricos, considerando sua atual autonomia. “Hoje em dia você pode dirigir seu carro por qualquer lugar da cidade porque sabe que haverá posto de combustível fóssil”, disse ele. E continuou: “é importante que a legislação urbanística preveja locais com potencial a instalação destes locais de recarga”. Nos Estados Unidos, estes pontos são localizados, geralmente, em estacionamentos de shoppings centers, lojas de departamento e conveniências. Assim, enquanto o carro recarrega, o proprietário pode matar o tempo fazendo algumas compras ou um lanche.

Fortaleza tem uma experiência interessante com bicicletas. A cidade deseja ser conhecida como a mais ciclável do Brasil em alguns anos. E o governo abraçou a ideia. Suas ruas, atualmente, estão riscadas com 245 km de ciclovias, e há uma meta tangível de 324 km até 2020.

As estações estão em diversos locais de interesse público, como terminais rodoviários, shopping centers, parques, centros comerciais, calçadões na praia, entre outros. Em 5 anos, o uso da bicicleta cresceu, aproximadamente, 261%. Já são mais de 80 estações de bicicletas compartilhadas espalhadas por toda a capital cearense e o sistema atende mais de 200 mil usuários/mês. Porém, engana-se que todo esse uso está relacionado ao turismo. Foi através de uma pesquisa realizada pela própria prefeitura que identificou-se o perfil predominante dos usuários do sistema. 75% deles são pessoas que alugam as bicicletas para irem ao trabalho, aos estudos ou às compras. Estrategicamente ligada ao sistema modal de transporte público, a bicicleta compartilhada aqui tem feito o que o patinete elétrico está fazendo pelo mundo: ligando o usuário do sistema de transporte público ao seu destino final.

Um pouco mais para cá, Palmas, no Tocantins, tem usado o calor ao seu favor. Palmas Solar, como foi batizado, é um programa de incentivo tecnológico ao uso de energia solar. O objetivo é conceder benefícios a quem deseje instalar os sistemas em suas casas e empresas, além da obrigatoriedade de utilização para construções públicas, de acordo com Alan Barbiero, ex secretário de planejamento do município. Os benefícios são o desconto de até 80% do valor IPTU, no ISSQN e no ITBI, sob algumas condições.

Mudando de cidade pra city, Portland, nos Estados Unidos, disputa anualmente o título de cidade mais verde do EUA, e é considerada uma das mais verdes de todo o mundo. As medidas governamentais  adotadas também baseiam-se no incentivo à população através de descontos progressivos em impostos, bem como utiliza-se de soluções inovadoras para problemas atuais. E foi assim que conseguiram que 5 milhões de m³ de água de chuva deixam de ir para os sistemas de drenagem da cidade, por ano. Ou que cerca uma área equivalente a de 20 campos de futebol em grama  fosse instalada sobre as edificações de Portland. Isso no primeiro ano do programa.

Em todos esses exemplos, vemos o duplo papel do governo, tanto no incentivo quanto na utilização de meios inovadores de se atingir objetivos estratégicos que valorizem sua população, através das características locais. Afinal, Porto Velho tem suas características locais e precisa respeitar isso. A técnica e tecnologia estão disponíveis, e o regramento está sendo atualizado. Caberá a nós, munícipes, evoluir e levar a cidade conosco. Afinal, como diz a básica filosofia facebookiana, você muda e o mundo muda com você.