Eu, empreendedor público

Certa vez, um antigo professor de faculdade me chamou para participar de uma semana acadêmica de engenharia. O objetivo do evento era realizar uma série de palestras com alunos egressos, tratando sobre um assunto em específico: empreendedorismo na engenharia civil.

Fiquei honrado com o convite, mas lembrei ao professor que eu sou funcionário público e pouco atuo na iniciativa privada. A conversa se desenvolvia pelo WhatsApp, e as frases seguintes foram a resposta deste professor ao meu porém:

“Sabia que você iria falar isto. Mas, veja só, Matheus, a definição de empreendedorismo está ligada a inovação. Empreendedorismo é o processo de iniciativa de implementar novos negócios ou mudanças em empresas já existentes. Seu desafio é passar isto aos alunos, falar das suas inovações em um ambiente menos favorável a grandes mudanças.”

Aquilo me pegou no contrapé. Eu, tão preocupado em não “engessar”, tinha uma definição predeterminada e preconceituosa à minha própria atuação.

Só vim entender, na íntegra, o que é ser servidor público quando passei a atuar na Prefeitura de Porto Velho, em 2012. Dentre cerca de 13.000 servidores, mais ou menos 45 são engenheiros civis e cabe tão somente a mim o “engessar”. Implantar novas ideias – empreender, em um meio com tantas normativas e protocolos à serem seguidos, ritos que são preconizados à tantas décadas, é visto como um risco que, talvez, não deva ser seguido. 

Pois bem, aceito diariamente o desafio de fazer o novo. De buscar inspirações em profissionais inovadores, em sistemas de vanguarda, para melhorar o que faço e o que ofereço como produto final. Tenho mais horas de cursos de especialização e certificados que boa parte dos meus colegas da iniciativa privada e, ainda sim, não paro. Sou o único funcionário público em minha turma de MBA de Gerenciamento de Projetos, pela FGV, e me sinto no lugar certo. Não se trata de sair na frente, se trata de ir na direção certa.

Nestes seis anos de Prefeitura de Porto Velho, dediquei quatro à elaboração de projetos de instalações prediais e de infraestrutura; De 2017 para cá, estou à frente de uma gerência de gestão de programas e projetos estratégicos. Faço parte de um time de sete pessoas, onde a hierarquia – linear, por nossa escolha, varia minha atuação entre gerir uma equipe de engenheiros para desenvolvimento de um determinado projeto à mobilização da população da cidade para participação em audiências públicas, com direito a entrega de panfleto e colagem de cartazes.

Buscar consultores no aeroporto com seu próprio carro, conduzi-los na coleta de dados por cerca de 100 km em um único dia, com seu próprio combustível, só para que o cronograma seja cumprido. Mediar oficinas comunitárias em noites que sabidamente não nos renderão qualquer centavo de hora extra. Nós somos o óleo da engrenagem.

Fazer o que deve ser feito. Concluir um projeto com sucesso. Quem acha que isso é inocência não teria um lugar em um departamento de empreendedorismo. Isto é fazer se cumprir o cronograma. Isto é ser a diferença. Entregar mais do que se espera. Ser grato pelas oportunidades. Fazer valer o dinheiro em nós investido. Isto é servir ao seu município. Isto é ser servidor público.

28 de outubro. Dia do servidor público.